Vitrine de compras.
Você olha, gosta do produto, diz: é tudo o que eu quero pra mim.
Olha outra vez. Observa melhor as letras em fonte 8 e percebe que não tem dinheiro pra levar pra casa.
Não estou apaixonada porque é inviável ter esse presente.
Preciso trabalhar mais, porque nem meu limite seria capaz de parcelar o produto.
Aquele tipo de casaco que nem cinco anos de trabalho são capazes de parcelar.
Meu Vison está pendurado no cabide dos sonhos.
Por isso tenho certeza de que não é paixão.
É algo como desejo pelo inatingível ou sonho de consumo. Como melhor lhe caber.
Não estou apaixonada porque a paixão pressupõe uma resposta positiva da vendedora.
Mas ela só pode olhar para os meus olhos pobres, pensando que eu era pobre, analisando as intenções de pobre e chegando a pobre conclusão de que meu salário seria cantado ao menos cinco tons abaixo da nota alcançada.
Ganhei um cartão da loja, um valor estimado em dólares e o sorriso da vendedora, excelente atriz, ao dizer que esperava meu retorno para levar o produto.
Não provei. Cheguei a tocar no cabide, até sorri pra ele, mas não deu em nada.
Continua no varão e, uma vez ou outra, sai do cabide pra ser vestido no provador.
Volta para o cabide e lá permanece.
Ainda que seja meu número e combine com o tom da minha pele, é caro demais.
A loja desse produto fica longe, embora bem localizada. Isso porque, como pobre que sou, moro mal. Vivo mal.
De que me adiantaria levar um Vison? Aonde eu usaria um casaco como aquele? Compraria para emprestar, alugar, deixar dentro de casa ou vender por um preço maior.
Não. Não se deve consumir aquilo que não lhe pertence. Aquilo que não é do seu mundo.
A menos que eu mude de mundo.
Ou mude o gosto pelo casaco.
É ele quem serve bem em mim. Sou eu quem combina com ele.
Mas entre eu usá-lo e ele ser usado, existem anos de trabalho e dedicação.
É possível que ele saia de moda quando, por ventura, meu dinheiro alcance levá-lo para casa.
É possível, também, que ele acabe sua vida luxuosa em um brexó e que, por ordem do destino, nossos caminhos se cruzem.
Quem sabe aí sim, juntando os trocados do bolso, eu seja capaz de pagar.
Por hora. Não estou apaixonada.